Após 500 anos, choveu no deserto do Atacama – mas teria sido melhor não
O deserto do Atacama, localizado no norte do Chile, é o mais alto do mundo e, se excluirmos as regiões polares da Terra, o mais seco também.
As chuvas por lá são raras, mas em algumas exceções, a precipitação pode causar fenômenos como os “desertos floridos”: a cada cinco ou dez anos, grandes áreas repletas de flores brotam nas regiões secas. A última vez que isso aconteceu foi em 2017. Há de se pensar, então, que um pouco de água não faz mal à fauna e flora de lá, certo? Não exatamente.
Na última semana, uma pesquisa publicada na revista Scientific Reports mostrou que há águas que nem sempre vêm para o bem. Cientistas analisaram uma região hiperárida do Atacama, que estava seca havia 500 anos, e descobriram que, quando finalmente choveu lá, o efeito foi negativo: boa parte dos organismos locais morreu.
O estudo analisou um pedaço específico do deserto, ao sul da cidade de Antofagasta. A coleta de informações começou em 2015, quando as precipitações, que não aconteciam há meio milênio, voltaram a ocorrer. Por ali, lagoas foram formadas e, das 16 espécies de micróbios que viviam por lá, os cientistas calculam que apenas 2 a 4 sobreviveram.
A hipótese mais aceita para a extinção dos bichinhos é a do chamado estresse osmótico, que acontece quando grandes volumes de água aparecem subitamente numa região que estava árida por muito tempo. Os organismos que vivem ali, adaptados para viver em um ambiente inóspito como o do Atacama, não conseguiram lidar com a repentina mudança.
Life on Mars
A descoberta traz um alerta para as mudanças climáticas do oceano Pacífico, que causaram as chuvas inesperadas no deserto. Mas, para além do quesito ambiental, a pesquisa tem também aspirações interplanetárias.
O estudo foi realizado pelo Centro de Astrobiologia da Espanha em parceria com universidades do Chile. A astrobiologia, ou exobiologia, estuda a origem e a evolução da vida no Universo. Mas você deve estar se perguntando: o que isso tem a ver com as chuvas no deserto do Atacama?
Acontece que os pesquisadores colocaram os resultados do estudo em terras chilenas no contexto da exploração astrobiológica de Marte, um planeta hiperárido e que, segundo teorias, também sofreu fortes inundações bilhões de anos atrás.
As pesquisas em torno do nosso vizinho do Sistema Solar procuram descobrir como se deu a evolução e a extinção de vida no planeta vermelho, e se o reaparecimento de água foi o responsável por acabar com a vida por lá – e estudos como a do deserto do Atacama podem ajudar a recontar essa história.
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