Geral | Da Redação/Com Assessoria | 12/06/2015 10h43

Brasil continua na luta pela erradicação do trabalho infantil

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Nascida em Santa Maria da Vitória (BA), Lindaci Maria Cortes, 51 anos, teve uma infância diferente de muitas crianças. Brincar e estudar não faziam parte do seu dia a dia. Era na lavoura, ajudando seu pai a capinar, plantar e colher que ela preenchia o tempo. E ainda ajudava sua mãe no trabalho de lavadeira. “Comecei com 10 anos. Lembro que tinha que andar muito até o rio onde minha mãe lavava as roupas, carregando trouxas nas costas e cabeça. Além disso, ajudava com a limpeza da casa e na cozinha”, conta. Lindaci conheceu a escola aos 11 anos, mas a vontade de estudar durou apenas dois anos. “Mal sei escrever meu nome.” A dificuldade familiar fez com que ela desistisse dos estudos. “Não tínhamos dinheiro para roupa, material escolar, passávamos necessidade. Estudar como dessa forma?” 

Aos 14 anos casou e continuou a trabalhar com o que aprendeu desde pequena, lavoura e afazeres domésticos. Assim permaneceu até os 29 anos, quando chegou em Brasília e foi trabalhar como doméstica. Hoje, ela é agricultora familiar no assentamento Chapadinha, na região de Planaltina, na capital federal. 

Mãe de três filhas e avó de sete netos, dois criados por ela, Lindaci conta que nunca deixou nenhum deles trabalhar. “Sempre estimulei a estudar. Não quero que eles passem pela mesma história”. A agricultora quer vê-los em uma faculdade. “ É o sonho de todo pai e também o meu, como avó. Se depender de mim, eles terão um futuro melhor”. 

A determinação de Lindaci contribui para a redução do trabalho infantil no Brasil. Entre 2001 e 2013, o número de crianças e adolescentes nessa situação diminuiu em 60%. No país, o trabalho precoce é proibido por lei. Só pode entrar no mercado de trabalho quem tem mais de 14 anos na condição de aprendiz. 

A secretária nacional de Assistência Social do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), Ieda Castro, explica que o avanço do combate ao trabalho infantil no Brasil está associado à conjugação de esforços. Uma das ações é o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti), que se articula com uma rede de proteção social para combater a exploração de crianças e adolescentes. “Ampliamos a oferta dos serviços de convivência para que aqueles que estejam nessa situação possam participar de atividades no contra turno escolar. O Programa Mais Educação, que permite às crianças permanecerem na escola no contra turno escolar, com atividades variadas, é um exemplo”, frisa Ieda Castro. 

Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti) - Desde 2013, o Peti evolui para atender aos desafios que se colocam para o Brasil erradicar o trabalho infantil. O redesenho do programa foi estruturado a partir do Plano Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção ao Adolescente Trabalhador e da Carta de Constituição de Estratégias em Defesa da Proteção Integral dos Direitos da Criança e do Adolescente. 

O atendimento às famílias passou a ser feito também nos Centros de Referência Especializados de Assistência Social (Creas) e nos Centros de Atendimento à População de Rua (Centros POP), que fazem a busca ativa de crianças e adolescentes com equipes volantes vinculadas aos Centros de Referência de Assistência Social (Cras). 

Esse atendimento é garantido pelo Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV), que se firma como estratégia de prevenção ao trabalho infantil, podendo ser utilizado para o trabalho social com outros públicos, inc lusive intergeracional, conforme diagnóstico e estratégia metodológica que melhor se adaptar às especificidades do território. 

Além disso, o Peti estruturou Ações Estratégicas em cinco eixos: 

  • Informação e mobilização: sensibilização, mobilização, realização de campanhas e acompanhamento de audiências públicas;
  • Identificação: busca ativa e registro no Cadastro Único;
  • Proteção social: transferência de renda (continua a integração Bolsa Família e PETI), inserção das crianças, adolescentes e suas famílias em serviços socioassistenciais e encaminhamento para serviços de saúde, educação, cultura, esporte, lazer ou trabalho (intersetorialidade);
  • Defesa e responsabilização: reforço das ações de fiscalização, acompanhamento das famílias com aplicação de medidas protetivas, articuladas com Poder Judiciário, Ministério Público e Conselhos Tutelares;
  • Monitoramento: registro em sistema de informação e monitoramento do processo de identificação e cadastr amento (Cadastro Único), do atendimento em serviços socioassistenciais.  

A secretária destaca a importância da Busca Ativa, que alcança quem não acessa serviços públicos e a rede de proteção social. O serviço ajuda a identificar situações de exploração e possibilita a inclusão de crianças e adolescentes nesta situação, e suas famílias, no Cadastro Único. Esta ação é reforçada pelo trabalho sistemático de acompanhamento familiar e de atividades socioeducativas para as crianças e adolescentes. 

“Talvez a maior dificuldade que temos hoje é identificar crianças e adolescentes nas atividades informais. Muitas vezes é nas próprias residências, ou nas de terceiros, que permanece a exploração do trabalho infantil. Nas atividades no campo isso também está ligado ao fator cultural e desconsidera as consequências negativas do trabalho precoce”, ressalta a secretária. 

Para a secretária nacional de Assistência Social d o MDS, a política de transferência de renda associada ao trabalho social e à geração de oportunidade de trabalho tem contribuído fortemente para a redução da exploração do trabalho infantil. Mas ela alerta que pobreza e trabalho infantil estão muito próximos, o que reforça a importância do fortalecimento da rede de proteção social. “Existem muitas entidades não governamentais que fazem esse trabalho muito bem e podem se somar ao poder público.” 

Ieda Castro afirma que Dia Internacional de Combate ao Trabalho Infantil, celebrado nesta sexta-feira (12), é uma oportunidade para sensibilizar, informar, debater e dar destaque à questão. “Muita coisa já foi feita, mas precisamos de mais; de uma ação intersetorial que se multiplique entre os três entes da federação, descentralizar essas ações estratégicas e que cada ente governamental se comprometa.” 

Conferência Global – Em 2013, o Brasil sediou, a pedido da Organização Internacional do Trabalho (OIT), a 3ª Conferênci a Global sobre o Trabalho Infantil, com a participação de 156 países. Na ocasião, o governo da Argentina se responsabilizou a organizar a 4ª Conferência, que será realizada em 2016, onde serão avaliados os avanços obtidos por todos os países. 

Além das ações estratégicas do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti), o Brasil está trabalhando com um projeto regional, a América Latina Livre do Trabalho Infantil, que reúne 25 países desse continente. A iniciativa é parte dos preparativos para a 4ª Conferência Global e reforça o compromisso pela erradicação do trabalho infantil. 

Segundo a representante do MDS no projeto, Paula Montagner, a ideia é atuar em conjunto para que as boas práticas dos diferentes países sejam conhecidas. “Assim como no Brasil, muitos países têm problemas com o trabalho infantil no campo. Estamos buscando metodologias para atuar melhor junto com populações isoladas, que culturalmente têm no processo de formação das crianças e adolescentes a participação no trabalho”, explica. 

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