Saúde | Com Agencia Senado | 07/03/2024 13h54

Especialistas defendem integração, vacinas e tecnologia no combate à dengue

Compartilhe:

A integração de conhecimento, o desenvolvimento de inovações e o uso de novas tecnologias, associados à produção de imunizantes no Brasil, são fundamentais para o combate à dengue no país, além da vacinação da população em tempo hábil e a adoção das medidas tradicionais de prevenção da doença.
A avaliação foi feita nesta quarta-feira (6), em audiência pública, na Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação e Informática (CCT), que debateu as estratégias de combate efetivo da dengue no Brasil. O debate na comissão, presidida pelo senador Carlos Viana (Podemos-MG), é realizado no momento em que o país enfrenta uma epidemia de dengue.

Em 2024, o Brasil passa pela maior epidemia da doença, considerando somente os dois primeiros meses deste ano. Dados mais recentes do Ministério da Saúde indicam que oito estados brasileiros e o Distrito Federal concentram 91% de 1.253.000 casos de dengue notificados até 5 de março. Já são 299 mortes por dengue e 765 óbitos em investigação, magnitude de transmissão acima daquela verificada em 2023.

De 2013 a 2022, 52% dos casos notificados no Brasil ocorreram em municípios de grande porte. O Ministério da Saúde reconhece o problema de saúde pública e observa que, quanto maior a população sob risco, maior vai ser a concentração. O país tem 326 municípios acima de 100 mil habitantes e 177 deles têm transmissão persistente, o que representa 48% dos casos na série histórica e 93% dos casos prováveis em municípios acima de 100 mil habitantes. Esse foi um dos critérios utilizados pelo governo para definir as áreas de implementação da vacina contra a dengue.

Situação de emergência
Para o senador Astronauta Marcos Pontes (PL-SP), que propôs a realização da audiência pública (REQ 1/2024 - CCT), a ocorrência da dengue é verificada há muitos anos, “e já está mais do que na hora de aplicar conhecimento e tecnologia para isso ser mitigado”.

— Está na hora da gente fazer alguma coisa efetiva. Vemos uma situação de emergência. Tivemos no ano passado os primeiros indícios disso, inclusive com a existência de vacina japonesa aprovada pela Anvisa [Agência Nacional de Vigilância Sanitária] em março. É um problema que precisa ser cuidado. O Brasil tem essa tendência de trabalhar mais na correção do que na prevenção. A gente precisa reverter esse quadro, e isso acontece em muitas áreas, não só na saúde, como nos desastres naturais, deslizamentos de terra e enchentes. Isso deve ser tema de um trabalho muito intenso de prevenção — afirmou.

Problema global
Coordenadora-geral de Vigilância de Arboviroses do Ministério da Saúde, Lívia Carla Vinhal Frutuoso destacou que a dengue é o maior problema de saúde pública atual, presente em mais de 100 países. Metade da população mundial vive em áreas de risco, cerca de 100 a 400 milhões de infecções são estimadas a cada ano pela doença. Nos últimos tempos, aumentou dez vezes o número de casos notificados, passando de 500 para 5,2 milhões, com expansão das áreas da detecção da doença, inclusive em países da Europa.

— A gente percebe que é uma doença amplamente dispersa em todos os continentes do mundo. A gente tem detecção de dengue desde 1986. A partir de 2010, os casos passam a ser contados aos milhões e os intervalos entre essas epidemias são cada vez mais curtos. A nossa maior epidemia, somando as três arboviroses principais [dengue, zika e chikungunya], aconteceu em 2016, quando a gente passou a detectar o zyka no Brasil, logo depois também da introdução do chikungunya aqui nas Américas e também no nosso país, em 2014 — lembrou.

Mosquito “aliado”
Pesquisador em saúde pública da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Luciano Andrade Moreira defendeu a importância de programa de combate hoje presente em 14 países, como Indonésia, Austrália, Vietnã e Colômbia, e no Brasil conduzido desde 2012 pela Fiocruz. O método — que envolve a liberação de mosquito aedes aegypti infectado com a bactéria wolbachia, para controle de dengue, zyka e chikungunya — consiste na liberação de wolbitos (aedes aegypti com wolbachia) para que se reproduzam com os aedes aegyptis locais e seja estabelecida uma nova população desses insetos, todos com wolbachia.

Até 2023, o programa contemplou 3,2 milhões de pessoas no Brasil em cinco municípios, onde diminuiu a ocorrência de arboviroses. Dados de 2021 mostram redução de 69% nos casos de dengue, 60% nos casos de chikungunya e 37% nos casos de zyca em Niterói (RJ), 38% a menos de casos de dengue no Rio de Janeiro. O programa também é adotado em Belo Horizonte (MG), Campo Grande (MS) e Petrolina (PE).

— A wolbachia foi inserida nos ovos do aedes aegypti. Ela bloqueia arbovírus como a dengue, zyka e chikungunya. A wolbachia foi retirada da drosófila, que é a mosca da fruta, e introduzida nos ovos do aedes aegypti. É importante ressaltar que não houve nenhum processo de modificação genética nem no mosquito nem na bactéria nesse processo. A partir de então você tem uma linhagem de mosquitos aedes aegypti contendo a wolbachia e com isso a gente só faz a propagação em larga escala para utilização — explicou.

Produção de vacinas
Algumas iniciativas que podem contribuir para o combate a dengue, como o Brasil Biotec, Cabbi, Remonar e Rede Vírus, entre outros, foram citadas pelo coordenador-geral de Ciências da Saúde, Biotecnológicas e Agrárias do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), Thiago de Mello Moraes. Ele defendeu programas de integração regional de cooperação e o desenvolvimento de uma frente múltipla para desenvolvimento de uma nova vacina contra a dengue usando vetores virais ou tecnologia de RNA, feita a partir de um componente sintético que corresponde a uma determinada proteína do agente infeccioso.

— Foi feita uma pareceria entre o MCTI e a UFMG [Universidade Federal de Minas Gerais] para a criação do Centro Nacional de Vacinas, que é um grande problema. Acho que seria o maior desafio do MCTI no momento, que é promover o amadurecimento tecnológico dos projetos. É claro que a gente tem uma série de projetos de desenvolvimento de vacinas. É claro que a gente já tem vacina comercial disponível, o [Instituto] Butantan está finalizando a sua, que em breve deve estar no mercado também, mas a gente não pode abdicar do desenvolvimento — ponderou.

“Aedes do bem”
A diretora-geral da Oxitec do Brasil, Natalia Verza Ferreira, reforçou que a ciência está contribuindo não só com a inovação, mas com a formação de pessoas. Ela defendeu o “aedes do bem”, um tipo de solução biológica de combate à dengue que não se confunde com a a wolbachia, conforme explicou.

O “aedes do bem” é um produto considerado larvicida, que reúne mosquitos capazes de limitar a reprodução da própria espécie, diminuindo o número de fêmeas, que picam e são as verdadeiras transmissoras de doenças.

— A wolbachia atua no controle da doença, e o aedes do bem atua no controle do mosquito. São tecnologias parecidas, complementares, que podem ser usadas concomitantemente. Não existe uma bala de prata, é um problema complexo e a gente precisa de todas as inovações, todas as ferramentas que a gente puder ter — esclareceu.

VEJA MAIS
Compartilhe:

PARCEIROS